A Quaresma é um dos períodos mais significativos no calendário litúrgico católico. Durante 40 dias, os fiéis são chamados a viver um tempo de penitência, oração, jejum e caridade, com o objetivo de se prepararem espiritualmente para a celebração da Páscoa. Este tempo de preparação tem raízes profundas tanto na Sagrada Escritura quanto nas tradições da Igreja Católica. Ao longo da história, a Quaresma foi vista como um caminho de conversão, renovação e intimidade com Deus, sendo enriquecida por ensinamentos teológicos que abordam a natureza da penitência, a busca pela santidade e a preparação para a Ressurreição de Cristo. A Quaresma é frequentemente associada ao jejum de 40 dias de Jesus no deserto, que aparece em vários Evangelhos. Em Mateus 4,1-2, lemos: “Então, Jesus foi levado pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo. Depois de jejuar quarenta dias e quarenta noites, teve fome”. O número 40, presente na Bíblia, é um número simbólico que representa um período de preparação e purificação, sendo usado para descrever momentos de prova e renovação na vida do povo de Deus, como os 40 anos que os israelitas passaram no deserto (Êxodo 16,35) e os 40 dias de Moisés no Monte Sinai (Êxodo 34,28).
A Quaresma, portanto, é uma imitação do retiro de Jesus no deserto, onde Ele se preparou para iniciar sua missão pública. Este tempo de jejum e oração é um momento em que os cristãos se retiram das distrações do mundo para buscar mais intensamente a presença de Deus. O jejum e a oração, que são elementos essenciais da Quaresma, não têm como objetivo uma mera prática ascética, mas são meios para purificar o coração e aproximar-se mais de Deus.
Em Lucas 4,13, também lemos que, após a tentação no deserto, “quando o diabo acabou toda a tentação, afastou-se dele por algum tempo”. Isto sugere que a Quaresma é uma oportunidade para resistir às tentações, praticando a virtude e fortalecendo nossa fidelidade a Deus, como Jesus fez ao vencer as tentações no deserto.
Além disso, a Quaresma está profundamente ligada à temática do arrependimento e da conversão, que é um dos principais chamados de Jesus em sua missão terrena. Em Marcos 1,15, Jesus proclamou: “O tempo é chegado, e o Reino de Deus está próximo. Arrependei-vos e crede no evangelho”. A Quaresma é, assim, um tempo para viver esse arrependimento, ou seja, uma mudança interior que nos leva a afastar-nos do pecado e a nos voltar para Deus.
Quaresma não é apenas penitência exterior, mas uma jornada interior que nos leva à santificação. A Igreja Católica ensina que a Quaresma é um tempo de purificação do coração, de crescimento na fé e de preparação para a celebração da Páscoa. É um tempo para os fiéis se reconciliarem com Deus e com os outros, abrindo o coração para o perdão e para a misericórdia divina. A Quaresma é, assim, uma oportunidade para cada cristão se unir mais intimamente a Cristo, experimentando em sua própria vida a morte para o pecado e a ressurreição para uma vida nova em Cristo, conforme o ensino de São Paulo em Romanos 6,4: “Portanto, fomos sepultados com ele na morte pelo batismo, para que, assim como Cristo foi ressuscitado dos mortos pela glória do Pai, também nós andemos em novidade de vida”. Ao longo de 40 dias, nós cristãos somos chamados a uma conversão radical, a imitarmos Cristo em seu jejum e oração no deserto, e a buscarmos uma vida mais próxima de Deus, por meio da penitência, oração e caridade. Que este tempo de preparação não seja para nós apenas um tempo de práticas ascéticas, mas um verdadeiro caminho de crescimento espiritual, onde, como Igreja, nos preparamos para celebrar a Páscoa, a vitória de Cristo sobre o pecado e a morte conforme nos ensina São Paulo em Colossenses 3,1 : “Se, portanto, ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cristo está sentado à direita de Deus”
Que com Ele, o vencedor, sejamos também vitoriosos e possamos viver a vida nova que somente Ele pode nos dar.
Santa Quaresma a todos(as).
Mons. Antônio Robson Gonçalves